Pastores e conselheiros pastorais que têm uma preocupação genuína com seus paroquianos deparam-se freqüentemente com a necessidade de [...]
I. Introdução
Pastores e conselheiros pastorais que têm uma preocupação genuína com seus paroquianos deparam-se freqüentemente com a necessidade de encontrarem tratamento psicoterápico para os mesmos. O primeiro princípio de cuidado pastoral genuíno é saber quando encaminhar a pessoa. Isto requer a capacidade de discernir se a pessoa está lutando contra um sentimento a perturbação dentro dos limites da “normalidade” ou se esta perturbação é patológica. Além dos mais, requer o reconhecimento da relação existente entre as reivindicações e o poder da fé, por um lado, e, por outro, a arte psicoterapêutica.Esta relação entre fé e prática nas profissões de ajuda será provavelmente desvalorizada ou mal concebida, a menos que parta de uma genuína apreciação da relação entre as ciências de teologia e psicologia. O fato de que tanto a teologia quanto a psicologia são ciências com suas próprias estruturas é não raramente mal compreendido, principalmente por pastores. Cada uma tem seu próprio lugar, método, perceptiva e contribuição. Ambas enfatizam o mesmo assunto, isto é, a questão da natureza da humanidade, usa patologia e sua dinâmica de saúde. Estas duas ciências iluminam uma à outra como duas luzes divinas brilhando sobre o meso assunto: uma da revelação especial (as Escrituras) e a outra da revelação geral (a criação). Interceptam-se e se iluminam uma à outra, como seria de esperar de todas as ciências, no nível teórico, de pesquisa e desenvolvimento de dados e no nível prático ou clínico. Ambas falam da incontestável verdade de Deus.
Nesta intersecção, a teologia e a psicologia, como ciências, estudam um conjunto de informações, análogas no nível cósmico e individual respectivamente. A teologia bíblica relata a odisséia humana universal do Éden, da queda e progressão para a salvação em Jesus Cristo. A psicologia relata o mundo perfeito do útero, do trauma do nascimento, da ansiedade provocada no adolescente pela separação e pelo crescimento em direção à pessoa completa. Em ambas as facetas da analogia, as experiências iniciais que definem a humanidade são a lembrança de um mundo perfeito e a expectativa de reencontrá-lo. A experiência de perda massiva é interpretada como alienação, e a vida e a saúde definidas como crescimento.
A história da criação de Adão imputou arbitrariamente à natureza as imagens divinas e o “status” de companheiro de Deus. O mesmo ocorre com a aliança de Deus com Abraão em Gênesis 12 e 17, e a forma como Jesus lidava com as pessoas demonstra a natureza incondicional da graça universal de Deus. Além disso, fica claro que esta graça radical transcende todas as táticas humanas de defesa e compensação, bem como a patologia psico-espiritual que produzem. Vai ao âmago de nossa desordem e trata da doença e não só dos sintomas. NO entanto, para que isto ocorra, as obstruções psicológicas à abertura e ao insight da graça precisam ser reduzidas. Para tanto, faz-se necessária a aplicação, a nível clínico, de uma combinação dos melhores insights, tanto da teologia quanto da psicologia, no nível onde ambas se interceptam. Estes insights relacionam-se principalmente com a antropologia, ao conceito da natureza da humanidade que pode ser desenvolvido pela psicologia e a teologia,especialmente no que se refere à natureza da teoria da personalidade científica.
Portanto, os pastores precisam aprender a confiar em ambos os livros de Deus: a natureza e as Escrituras, lembrando que nenhum deles poder ser lido acuradamente a não ser que seja encarado sob o ponto de vista cient’fico e cuidando que a integridade de ambas as ciências seja rigidamente protegida. Se qualquer uma das luzes divinas for ignorada ou desvalorizada, a verdade de Deus será distorcida ou descartada. Quando os pastores enfrentam a psicopatologia ao invés de uma confusão espiritual ou imaturidade, devem encaminhar seu paroquiano ao especialista apropriado. Caso contrário, estarão obstruindo a oportunidade que Deus tem de curar o paciente.
II. Exposição
Esta perspectiva tem certas aplicações práticas específicas quanto ao trabalho clínico. Primeiro, é imperativo que a perspectiva terapêutica inclua nossa apreciação da natureza, do “status”, dignidade, valor e destino inerentes aos seres humanos. Isto é, os psicoterapeutas precisam considerar o fato de que os homens refletem a imagem de Deus, que são seus companheiros na construção do Reino, que têm infinito valor aos seus olhos, apesar de suas distorções e patologias; e que estão destinados à perfeição como pessoas, visto serem imagem de Deus. Terapeutas que não assumem e não afirmam esta identidade a seus pacientes estão um tanto limitados quanto às suas possibilidades de ajuda.
Sócrates falou do destino dos homens como sendo a “perfeição da alma”, significando a realização e atualização total de tudo o que Deus nos deu em termos de nosso potencial. A perspectiva cristã assume as leis, visto que podem ser realizadas em Cristo, pela graça incondicional e radical de Deus.
Isto exige que o terapeuta encarne a graça na forma de aceitação incondicional do paciente e a afirmação do mesmo como pessoa. O terapeuta e o paciente devem encarar a si mesmos e à situação humana, que torna a vida possível e a morte útil, com um certo senso de humo, focalizando a verdade crucial de que o pecado e a patologia são uma falha do destino e não do dever.
Terapeutas que tenham esta perspectiva cristã, imbuídos da graça, facilitarão aos pastores o encaminhamento de seus paroquianos, confiantemente, quando há indivíduos de patologia no que se refere à área de pensamento, comportamento ou padrões de sentimento do indivíduo.
Ha patologias típicas e especialmente proeminentes em círculos cristãos, que requerem tratamento especializado. É claro que as mais óbvias são aquelas que envolvem alienação psicótica da realidade. Facilmente reconhecível. Há seis outros tipos de patologia que também devem ser examinados. Primeiro, rigidez excessiva; segundo, ansiedade neurótica não-proporcional à ameaça; terceiro, obsessão ou compulsividade quanto a rituais autodestruidores; quarto, culpa exagerada ou auto-estima diminuída; quinto, depressão mascarada e raiva internalizada e finalmente, achatamento do afeto, muitas vezes acompanhado de compensação exagerada numa forma falsa de excitamento. Estes itens sempre indicam psicopatologias e não meras deficiências espirituais. Nestes casos, o encaminhamento à psicoterapia é imperativo.
A pergunta então permanece: Quando, por que e a quem os pastores devem encaminhar seus paroquianos? Vamos tratar deste assunto passo a passo: Quando deve o pastor encaminhar uma pessoa ao terapeuta? Primeiro, quando aparecer qualquer uma dessas patologias ou quando se torna necessário remover obstáculos psicopatológicos, a fim de que o paciente possa alcançar crescimento psico-espiritual. Em segundo lugar, quando há uma tristeza profunda e insuperada pela morte de alguém, que cresce desproporcionalmente à perda. Terceiro, quando há uma defasagem entre a avaliação cognitiva ou racional de uma situação e a capacidade de reagir emocionalmente, com a percepção cognitiva, de uma forma apropriada e consistente. Às vezes, as pessoas são capazes de concordar com uma avaliação sensata de sua situação, mas não conseguem agir de uma forma congruente com esta percepção a nível emocional. Quarto, quando há uma defasagem entre a vontade ou intenção e a ação ou função comportamental. Quarto, quando há o período de entrar no jogo do comportamento ou conselho religioso do paciente e exagerar a patologia, ao invés de reduzi-la. Este perigo existe em todas as situações acima descritas e em todas aquelas onde há preocupação do paciente com o material religioso, no confronto com a patologia. Sexto, quando o pastor tem dúvidas, deve encaminhar o paroquiano como paciente a um especialista em terapia.
Por que o pastor deve proceder a este encaminhamento? Para evitar a repressão da verdade de Deus e providenciar a cura do paciente, exatamente como no caso em que encaminha ao médico uma pessoa que tenha quebrado seu braço, para que seja devidamente engessado. Além disto, para encorajar ao máximo o crescimento do paciente na direção do destino traçado por Deus.
A quem deve o pastor encaminhar seus paroquianos necessitados? De preferência a um psicólogo cristão. A primeira condição para que possa ser considerado psicólogo cristão é a necessidade de ser o melhor terapeuta possível. Preocupação religiosa não é jamais um bom substitutivo para o preparo psicoterapêutico de qualidade. O segundo principio é o de que um psicoterapeuta cristão vai encarnar a aceitação incondicional de Deus e a confirmação disto para aquela pessoa. O terceiro princípio para o psicoterapeuta cristão é manter os bois `frente da carroça’. As obstruções psicológicas devem ser removidas e curadas antes da libertação espiritual que leva à saúde e ao crescimento. O quarto principio é o de que o psicoterapeuta cristão deve ser suficientemente maduro para que tenha segurança quanto ao seu método e deve estar suficientemente preparado para utilizar uma ou outra técnica, conforme a necessidade do paciente. Ele (ou ela) deve estar suficientemente seguro(a) quanto à sua sexualidade, para que não se sinta ameaçado pela sexualidade de seu paciente nem se aproveite da mesma. O psicoterapeuta cristão deve estar suficientemente maduro quanto à sua fé, a fim de não impô-la ao paciente.
Se não há, no entanto, nenhum psicoterapeuta cristão disponível, o mais indicado é um não-cristao que seja um bom profissional. Deve ser alguém que esteja disposto a trabalhar junto com o pastor e que poderá estabelecer um relacionamento sadio com este e com o paciente. Este relacionamento deve incluir uma apreciação genuína da dimensão religiosa da vida do paciente e do pastor, como também a habilidade e vontade de informar a ambos sobre quando e como a religiosidade é sadia ou patológica ou patogênica.
III. Conclusão
Os pastores devem se lembrar de que estão tratando das necessidades de seus paroquianos e não das suas próprias. Isto deve constituir a base da decisão por um encaminhamento. Torna-se essencial para que se possa ministrar com integridade. Além do mais, o pastor pode-se sentir bem quanto ao encaminhamento, na medida em que tenha conseguido aceitar suas próprias patologias e limitações humanas. Bons pastores reconhecem que são “saradores feridos”, nos quais os paroquianos podem discernir a humildade curadora que pode mobilizar a vontade do paroquiano de se tornar paciente, a fim de alcançar crescimento e desenvolvimento libertador.
O pastor deve mostrar que encara com autêntico bom humor sua própria humanidade e a patologia de seu paroquiano perturbado e o processo de relacionamento entre eles. Também deve compreender a temporalidade e moralidade disto tudo. Desta forma, os pacientes podem ver no pastor um humor curativo que os estimula a continuar a sua peregrinação em direção à saúde e/ou ao céu.
(Traduzido de A Graça de Deus e a Saúde Humana, de J. Harold Ellens, Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos; Capítulo 2; por Esly Regina Souza de Carvalho. Com a devida autorização.
Categorias: : Pastores, Psicologia, Psicoterapia
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